Preparação para a morte: Paz do justo na hora da morte

PONTO II
“As almas dos justos estão nas aos Deus e não os tocará o tormento da morte. Pareceu, aos olhos dos insensatos, que morriam, mas elas estão na paz” (Sb 3,1). Parece aos olhos dos insensatos que os servos de Deus morrem na aflição e contra sua von-tade, do mesmo modo como os mundanos. Mas não é assim, porque Deus bem sabe consolar os seus filhos no derradeiro transe, e comunicar-lhes, mesmo entre as dores da morte, maravilhosa doçura, como antecipado sabor da glória que brevemente lhes dá de outorgar. Assim como os que morrem em pecado começam já a sentir no leito mortuário algo das pe-nas do inferno, pelo remorso, pelo terror e pelo de-sespero, os justos, ao contrário, com seus atos fre-qüentíssimos de amor a Deus, seus desejos e espe-ranças de gozar a presença do Senhor, já antes de morrer começam a desfrutar aquela santa paz que depois gozarão plenamente no céu. A morte dos San-tos não é castigo, mas sim recompensa.
Quando dá o sono a seus amados, eis aqui a he-rança do Senhor (Sl 126,2-3). A morte daquele que ama a Deus não é morte, mas sono; de sorte que bem poderá exclamar: Dormirei e repousarei na paz do Senhor (Sl 4,8).
O Padre Soares morreu em tão doce paz, que disse ao expirar: “Nunca pude imaginar que a morte me trouxesse tal suavidade”! O Cardeal Barônio foi admoestado por seu médico que não pensasse tanto na morte; ao que ele respondeu: “Por que não? Aca-so hei de temê-la? Não a receio; ao contrário, amo-a”. Segundo refere Santero, o Cardeal Ruffens, pre-parando-se para morrer pela fé, mandou que lhe trouxessem o seu melhor traje, dizendo que ia às bo-das. Quando avistou o patíbulo, atirou para longe o báculo em que se apoiava, e exclamou: Eia, meus pés, caminhai depressa, que o paraíso está perto. Antes de morrer, entoou o “Te Deum” para render graças a Deus de o fazer mártir da fé, e, cheio de a-legria, ofereceu a cabeça ao verdugo. São Francisco de Assis cantava na hora da morte e convidou a que o acompanhassem os demais religiosos presentes. “Meu Pai, — disse-lhe o irmão Elias, — ao morrer, antes devemos chorar do que cantar”. “Pois eu, — replicou o Santo, — não posso fazer outra coisa se-não cantar, porque vejo que dentro em breve irei go-zar a Deus”. Uma religiosa de Santa Teresa, ao mor-rer na flor de sua idade, disse às irmãs que choravam ao derredor dela: “Ó meu Deus! Por que é que cho-rais vós? Vou encontrar-me com meu Jesus Cristo... Alegrai-vos comigo, se me amais”. Conta o Padre Granada que um caçador encontrou, certa vez, um solitário moribundo todo coberto de lepra, mas que estava a cantar. Disse-lhe o caçador: “Como é que podeis cantar nesse estado?” — E o ermitão respon-deu: “Irmão, entre Deus e mim não se interpõe outra muralha que este meu corpo, e como agora vejo que se vai ela caindo aos pedaços, que se desmorona o cárcere, e que, em breve, verei a Deus, me regozijo e canto”. Semelhante desejo de ver a Deus nutria San-to Inácio, o mártir, quando disse que, se as feras vi-essem devorá-lo, ele mesmo as provocaria para que o fizessem. Santa Catarina de Gênova não podia consentir que se considerasse a morte como desgra-ça, e exclamava: “Ó morte querida, quanto és mal apreciada! Por que não vens a mim, que te chamo noite e dia?”. Santa Teresa de Jesus desejava tanto a morte que o não morrer era sua morte, e com esse sentimento compôs sua célebre poesia: Morro, por-que não morro... Tal a morte dos Santos.

AFETOS E SÚPLICAS
Meu Deus e Sumo Bem, se pelo passado não vos amei, agora me entrego, porém, todo a vós. Re-nuncio a todas as criaturas e vos escolho como meu único amor, amabilíssimo Senhor meu. Dizei o que quereis de mim, pois estou decidido a cumprir vossa santa vontade... Jamais tornarei a vos ofender; em vosso serviço quero empregar o resto de minha vida. Dai-me força e ânimo para que compense com meu amor a ingratidão de que usei para convosco. Há muitos anos já que merecia arder nas chamas do in-ferno; mas vós esperastes e até me procurastes para me atrair todo a vós. Fazei agora que arda no fogo do vosso santo amor. Amo-vos, Bondade infinita. Que-reis ser o único objeto do meu  amor, e é justo, porque ninguém me amou tanto como vós, e porque unicamente a vós quero amar, e farei quanto puder para vos ser agradável.
Fazei de mim o que quiserdes. Basta que vos ame e que me ameis... Maria, minha Mãe, ajudai-me e rogai por mim a Jesus!

Fonte: Preparação para a Morte - Santo Afonso Maria de Ligório - Considerações sobre as verdades eternas - Tradução de Celso de Alencar - Versão PDF de FL. Castro - 2004

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